14 novembro 2007

Teorias da Aprendizagem: pra saber, tem que viver!



Tobias carregava uma pilha de livros. Entrou pela porta de casa, e avistou seu filho estudando na mesa de centro da sala. Seguindo nesta direção, achegou-se ao lado do filho e indagou-lhe:

- Tom! O que estudas à uma hora dessas? Já são 20:00h!

Seu filho demorou-se em responder. Em seguida, empurrando seus cadernos ao chão, exclamou, num tom de descontentamento:

- Por que é que temos que aprender as coisas? Por que é que Deus, com todo o seu poder e sabedoria, não criou o homem plenamente sábio, plenamente conhecedor de todas as artes e ciências?

Num gesto de ansiedade, levantou-se e acrescentou:

- Que ao menos tivesse feito o homem como os computadores, assim tudo já seria mais fácil! Bastaria plugar um pendrive, sei lá, num ouvido talvez; ou então, colocar um Cd para rodar em cima da cabeça... Sim! Poderíamos ser completamente diferentes do que somos! Por que não?

Diante das sérias argumentações do filho, Tobias não conseguiu esconder o riso. Depositou sua pilha de livros sobre a mesa de centro, e dirigiu ao filho as seguintes palavras:

- Meu filho, tu nunca pensastes a respeito daquela frase que consta no Slogan da tua faculdade?

- Frase em Slogan? Que frase? – Perguntou Tom, um tanto confuso.

- Ora, a frase: Pra saber tem que viver!

- O que tem esta frase?

- Bem, podemos concluir muitas coisas desta simples frase. E, uma delas é que o aprendizado é conseqüência do viver. Como diriam os Empiristas: “Todo o nosso conhecimento provém das sensações captadas pelos nossos 5 sentidos”. E se é assim, se tivéssemos esta sabedoria plena que você falou, nós na verdade não viveríamos. Pois não teríamos necessidade de aprender nada. Nada nos impressionaria! E em razão disso, talvez não tivéssemos nenhum sentimento. Enfim, todos agiriam sempre da mesma forma. Nossa conduta seria automática. E isso não é viver! É apenas existir!

- Mas Pai, quem são estes Empiristas?

- Os Empiristas são pensadores que acreditam na teoria de que o homem ao nascer é uma espécie de “tabula rasa”, uma verdadeira folha em branco. Acreditam que todo conhecimento provém do mundo externo.

- Mas então, porque é que filhos criados exatamente iguais podem se tornar mais inteligentes, com personalidades e gostos completamente diferentes, e também, com mais facilidade de aprender as coisas?

- Bem, quem responde esta questão é outro grupo de pensadores: os Inatistas. Segundo estes, a nossas capacidades, tais como: inteligência, personalidade, emoções, gostos, tendências, etc., existam pré-formadas desde o nascimento. Tais atributos nos são repassados através da hereditariedade.

- Compreendi! Os Empiristas acreditam que o nosso aprendizado inicia após o nascimento. Enquanto que os Inatistas pensam que todos nós já possuímos, antes mesmo de nascer, algum tipo de registros ou conhecimentos. Seria mais ou menos isso?

- Sim! É exatamente isso!

- Mas Pai, apesar de herdarmos todas estas características: inteligência, personalidade, gostos, tendências, etc., o meio externo, ou, as coisas que ocorrem conosco, não seriam capazes de alterar estas nossas características inatas? Ou seja, transformar nossa personalidade, modificar nossos gostos, tendências, etc.?

- Logicamente! E foi precisamente isso o que concluíram os Behavioristas. Segundo eles, a aprendizagem é uma mudança em nosso comportamento, e ocorre através de estímulos e respostas. Estímulos são agentes ambientais que atuam sobre o nosso organismo, fazendo-o emitir uma resposta ou aumentando a probabilidade de resposta. Respostas são as reações físicas do nosso organismo a uma estimulação. Para o behaviorismo, o organismo é sempre neutro, passivo, reativo.

- Sempre neutro, passivo, reativo? Isso significa que não temos livre-arbítrio, não é mesmo? Mas então, se são os estímulos externos que dirigem nossas ações, por que é que mediante um mesmo estímulo as pessoas agem de forma completamente diferente? Vejamos um exemplo: Em uma situação de perigo ou pavor, há pessoas que fogem, há aqueles que ficam paralisados, e também há aqueles que se mantém emocionalmente instáveis, ou seja, são capazes de enfrentar as adversidades. Como se explica isso?

- Bem, certamente que estas diferentes atitudes possuem relação com os aprendizados anteriores destas pessoas, e também, com as suas características hereditárias. Porém, para entendermos o que é que realmente leva as pessoas a agirem assim, é necessário compreendermos o funcionamento de nossos processos mentais. E foi o que fizeram os cognitivistas. Os cognitivistas estudaram como as pessoas lidam com os estímulos ambientais, organizam dados, sentem e resolvem problemas, adquirem conceitos e empregam símbolos, etc. Enfim, estudaram tudo aquilo que há entre um estímulo e uma resposta.

- Interessante! E o que concluíram em seus estudos?

- Infelizmente não posso falar a respeito de todas as suas conclusões. Pois existem diversas teorias e diversos autores cognitivistas. No entanto, posso falar a respeito das teorias formuladas por um cognitivista bastante conhecido: Jean Piaget. Agora, ele é na verdade mais especificamente categorizado como construtivista. Mas enfim... Segundo Piaget a criança constrói estruturas cognitivas – espécies de esquemas ou mapas mentais – para compreender e responder às experiências biológicas-internas, e ambientais-externas. Assim, com o decorrer do seu desenvolvimento, a elaboração destas estruturas mentais torna-se cada vez mais sofisticada, movendo-se de alguns reflexos inatos, tais como gritar e sugar, para atividades cada vez mais complexas. Segundo esta teoria, um conhecimento não se constrói a partir do nada, ou seja, essa construção só é possível a partir de algum conhecimento existente.

- Mas como são estas estruturas que as pessoas criam?

- Na teoria de Piaget existem quatro estruturas cognitivas primárias – também conhecidas como estágios do desenvolvimento – que são: sensorial-motor, pré-operação, operações concretas e operações formais. No estágio sensorial-motor (0-2 anos), a inteligência assume a forma de ações motoras. A inteligência no período pré-operação (3-7 anos) é de natureza intuitiva. A estrutura cognitiva durante o estágio de operações concretas (8-11 anos) é lógica, no entanto depende de referências concretas. No estágio final de operações formais (12-15 anos), pensar envolve abstrações.

- Entendi! Mas como exatamente estas estruturas cognitivas são formadas?

- Segundo o princípio de equilibração de Piaget, toda vez que o equilíbrio entre o organismo e o meio é perturbado, ocorre a necessidade de uma modificação. E esta modificação é possível graças aos processos tidos como: assimilação e acomodação. O processo de assimilação diz respeito a uma espécie de interpretação, a uma incorporação de elementos que vêm do meio para as suas estruturas mentais já existentes, enquanto que o processo de acomodação se refere à mudança da estrutura cognitiva para compreender e se adaptar a este meio.

- Agora não entendi nada. Poderia apresentar um exemplo?

- Claro! Por exemplo: o reconhecimento de uma certa similaridade entre um cachorro e um cavalo se dá através da assimilação, enquanto que a diferenciação, ou seja, a criação de um novo esquema, ou da elaboração de um esquema já existente, neste caso, para distinguir um animal do outro, ocorre por meio de uma acomodação. Ficou mais claro agora?

- Sim! Agora consegui entender. Mas me responda uma coisa: Será que com o auxílio de outras pessoas a construção destes esquemas cognitivos não pode ser acelerado ou beneficiado? Será que não podemos proporcionar melhores ambientes para o aprendizado? E, será que a nossa cultura também pode influenciar neste aprendizado?

- Certamente! Disto falará um autor chamado Vygotsky, categorizado como socio-interacionista, e não apenas interacionista como Piaget. Enfim, ambos pensadores atribuiram grande importância ao organismo ativo. Porém, enquanto Piaget coloca ênfase nos aspectos estruturais e nas leis de caráter universal - de origem biológica - do desenvolvimento, Vygotsky destaca as contribuições da cultura, da interação social e a dimensão histórica do desenvolvimento mental.

- Legal! E qual foi a contribuição de vygotsky em relação às teorias sobre a aprendizagem?

- Bem, para ele, o sujeito não é apenas ativo, mas interativo, porque forma conhecimentos e se constitui a partir de relações intra e interpessoais. É na troca com outros sujeitos e consigo próprio que se vão internalizando conhecimentos, papéis e funções sociais, o que permite a formação de conhecimentos e da própria consciência. Trata-se de um processo que caminha do plano social - relações interpessoais - para o plano individual interno - relações intra-pessoais.

- E qual a influencia destas relações no processo de aprendizado?

- Um dos conceitos mais importantes de Vygotsky é o de Zona de desenvolvimento proximal, que se relaciona com a diferença entre o que a criança consegue aprender sozinha e aquilo que consegue aprender com a ajuda de um adulto. Ou seja, existe uma potencialidade para aprender, que não é a mesma para todos os indivíduos. Segundo Vygotsky estas potencialidades se contróem pelo processo de internalização da interação social com materiais fornecidos pelas relações que se passam dentro de um cultura. Assim, um conceito que se pretenda trabalhar, como por exemplo, em matemática, requer sempre um grau de experiência anterior para os indivíduos.

- Realmente! Nossos relacionamentos afetam em muito o nosso aprendizado. Não somente em relação aquilo que podemos aprender, ou estamos capacitados a aprender, mas em relação ao nosso estado emocional no momento de aprender algo.

- Incrível! Agora não resisto em te dizer uma coisa: teus questionamentos são sempre tão apropriados, tão adequados a linha de raciocínio de minhas explicações, que já nem sei se foi você que herdou a inteligência de seu pai, ou se é Deus quem coloca as palavras em sua boca.

- Ora, considerando tudo o que aprendi até aqui, creio que talvez sejam as duas coisas, outras tantas coisas, e mais as coisas que você irá me explicar agora. Por favor, continue! Pois já é 01:00h da manhã. E uma coisa que eu ainda não te falei: eu tenho um trabalho para entregar amanhã na escola. E sabe? Era justamente sobre este tema!

- Sério?

- Sim!

- Então vou encerrar falando sobre Henry Wallon. Este autor propôs o estudo da pessoa como um todo, tanto em relação a seu caráter cognitivo quanto ao caráter afetivo e motor. Para Wallon, a cognição é importante, mas não mais importante que a afetividade ou a motricidade. Este autor não acredita que os estágios de desenvolvimento formem uma sequência linear e fixa, - como nas teorias de Piaget - ou que um estágio suprima o outro. Para Wallon, o estágio posterior amplia e reforma os anteriores. Ele pensa que é natural que, no desenvolvimento, ocorram rupturas, retrocessos e reviravoltas, o que para Piaget e os comportamentalistas parece algo improvável.

- Mas qual o papel da afetividade no desenvolvimento ou na aprendizagem?

- Existem períodos predominantemente afetivos focados na construção do eu, enquanto que estágios com predominância cognitiva estão mais direcionados à construção do real e compreensão do mundo físico. Estes estágios, períodos ou ciclos nunca cessam, mas perduram pela vida toda, uma vez que a emoção sobrepõe-se à razão quando o indivíduo se depara com o desconhecido. Deste modo, afetividade e cognição não são estanques e se revezam na dominância dos estágios. Assim, a afetividade possui papel fundamental no desenvolvimento da pessoa, pois é por meio dela que o ser humano demonstra seus desejos e vontades. A raiva, o medo, a tristeza, a alegria e os sentimentos mais profundos possuem uma função de grande relevância no aprendizado. E Wallon buscou destacar esta importância.

- Sim! Estes sentimentos e emoções influenciam em muito no aprendizado. Tanto que agora meu estado de espírito é tal, que vou juntar meus caderno e terminar meu trabalho. Mas antes disso, eu ainda tenho uma dúvida: memória e aprendizagem atualmente estão sempre associados ao cérebro e aos neurônios, e, no entanto até agora você nem falou nisso?

- É que ocorre o seguinte: quem aborda estes aspectos é a neurociência. A neurociência é uma das mais modernas correntes de pensamento no campo da psicologia da aprendizagem. Por isso autores mais antigos não falam muito a respeito de cérebro, neurônios, etc. São as neurociências que se dedicam ao estudo do sistema nervoso humano, ao estudo do cérebro e das bases biológicas da consciência, da percepção, da memória e da aprendizagem. Para os neurocientistas o cérebro não é um computador (Segundo as comparações que os primeiros cognitivistas faziam) - A estrutura das conexões neurais no cérebro é livre, flexível, "como que uma teia", sobreposta e redundante. Para um sistema como este é impossível funcionar como qualquer computador de processamento linear ou paralelo. A melhor descrição do cérebro será vê-lo como "um sistema auto-regulável". Os neurônios (células nervosas), conectados entre si através dos "dendritos", são cerca de 100 bilhões e podem ter entre 1 e 10.000 sinapses cada um. A complexidade das conexões possíveis é incalculável e o próprio padrão das conexões sinápticas pode alterar-se com o uso do cérebro, isto é, após uma conexão sináptica estabelece-se um padrão que faz com que essa mesma conexão seja mais fácil numa próxima vez (resultando mesmo numa alteração física da sinapse), como acontece, por exemplo, no campo da memória. Assim o cérebro altera-se com o uso através de toda a vida. Ou seja, a concentração mental e o esforço alteram a estrutura física do cérebro.

- É mesmo! Já ouvi falar que fazem poucos anos que se fala a respeito de neurônios. Agora, certamente que existem diversas outras teorias, diversos outros teóricos, tanto antigas, quanto modernas, não é mesmo? Mas, nem vou fazer mais nenhum questionamento, pois o que aprendi hoje já me é suficiente. Pai, muito obrigado pela ajuda!

- Que isso! Ensinar é minha função! É minha realização! É o sentido de minha existência! E por falar nisso, por acaso já ouvistes falar em Maslow? Carl Rogers? Ou então, Victor Frankl?

- Pouca coisa, mas já ouvi falar sim! Agora, quem sabe outra hora você me fala mais sobre eles?

- Mas por que você não aproveita agora que você está mais motivado?

- Pai, eu não estudo pedagogia! Lembra? E sabe, creio que nesta vida não terei tempo suficiente para saber tudo o que todos estes autores falaram sobre aprendizagem. Quem sabe na próxima vida?

- Próxima vida? Também existem teorias interessantes relacionadas a aprendizagem que abordam estes aspectos transpessoais: Jung, Ken Wilber, Stanislav Grof? Conhece-os?

- Pai, são 01:45! Obrigado pelas explicações e boa noite!

Tom recolheu suas coisas e foi para seu quarto. Tobias juntou sua pilha de livros, e indo em direção ao seu quarto, com um sorrizo estampado no rosto, pensava:

- Até que não seria nada mal algo como conectar um pendrive no ouvido para aprender coisas..., ou então, colocar um Cd ou Dvd para rodar em cima da cabeça!!! Quem sabe no futuro...

End.


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2 comentários:

  1. Sou professora de Psicologia da educação e estava procurando um texto que fosse atraente para minhas alunas e que ao memo tempo falasse do conteúdo, fiquei chocada de como não havia pensado nisso antes, este texto é o máximo, vou usá-lo em um trabalho avaliativo sobre os interacionistas. Parabén mesmo, é show de bola!!!

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  2. Sou professora de Psicologia da educação e estava procurando um texto que fosse atraente para minhas alunas e que ao memo tempo falasse do conteúdo, fiquei chocada de como não havia pensado nisso antes, este texto é o máximo, vou usá-lo em um trabalho avaliativo sobre os interacionistas. Parabén mesmo, é show de bola!!!

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